O debate isolacionismo-reintegracionismo aborrece. Aborrece e faz muito mal. A seguir proponho alguns apontamentos, bastante óbvios, que tencionam contribuir para sairmos das posições imobilistas em que levamos demasiado tempo enquistados.
Na minha opinião cumpre aceitarmos dous factos:
1. A norma castelã-isolacionista para o galego está consolidada e não vai desaparecer.
2. A norma histórico-internacionalista faz parte do movimento galeguista desde as suas origens e, ainda que minoritária, está em alça tanto qualitativa quanto quantitativamente e não tem traças de recuar.
Num tal contexto temos que aprender a conviver, fazer da necessidade virtude (lembremos: it is not a bug, it is a feature) e sermos quem de converter esta aparente dicotomia excludente numa fértil complementaridade, para o qual é indispensável paciência e respeito mútuo.
Acho que o reintegracionismo tem já alcançado massa crítica e madureza suficiente para abandonarmos posições vitimistas e defensivas e dedicarmo-nos a construir um espaço de nosso. Isto, evidentemente, já está a acontecer com sucessos da magnitude histórica como o de ter incorporado léxico galego ao vasto corpus internacional da nossa língua.
Acho que devemos respeitar o isolacionismo e deixá-lo seguir o seu caminho com as suas contradições, limitações e subvenções, sim, mas também, admitamo-lo, com as suas vantagens e potencialidades.
É difícil ignorar as discriminações passadas e presentes que sofreram e sofrem os que defendem a norma histórico-internacionalista. Mas se continuamos a dissipar energias em criar inimigos no nosso próprio campo, não havemos chegar muito longe. As circunstâncias são as que são e é neste contexto que temos que viver, trabalhar e avançar.
Complementariedade
Mas, voltemos ao assunto da complementaridade. Se todos, isolacionistas e reintegracionistas, assumimos a inevitabilidade do doutro, acho que poderemos avançar juntos de forma construtiva e produtiva.
A proposta das duas normativas já se tem posto sobre o tapete em inúmeras ocasiões, mas acho que é o momento de passar, com iminência e ousadia, à acção prática. A criação da Academia Galega da Língua Portuguesa (AGLP), a sua boa recepção internacional e os êxitos acima assinalados, assim o requerem.
Cabem ao meu ver dous modelos: o modelo norueguês (uma língua, duas normativas) ou o modelo luxemburguês (duas línguas, duas normativas, embora o alemão padrão faça, de facto, as vezes de língua tecto internacional do luxemburguês). Do meu ponto de vista os dous seriam igualmente válidos, embora a curto termo veja mais factível o segundo.
Não nos enganemos, as duas opções implicam o reconhecimento, tácito ou explícito, do português como língua própria da Galiza. Este movimento táctico havia ter, ao meu entender, consequências muito favoráveis nos dous lados da raia, pois a nossa língua passaria ter o status de língua oficial em dous Estados fronteiriços da União Europeia, com todas as salutares implicações, inclusive as económicas, que isto traz consigo.
A nível interno, uma tal solução permitiria conciliar as vantagens do isolacionismo (facilidade de aprendizagem para hispanófonos, auto-indentificação identitária duma parte da população, menor rejeição por parte do espanholismo) e as vantagens do reintegracionismo (carácter internacional, diversidade cultural, potencial económico, recuperação das grafias históricas), sem renunciarmos a nada. Mas, para que isto seja possível, cada facção precisa da solidariedade, cumplicidade e generosidade da outra.
O establishment galeguista não deve continuar por mais tempo a manter a força crescente do reintegracionismo excluída da cultura galega, pois resulta num esbanjamento de energias estéril e potencialmente nocivo.